MALASAVENTURAS – SAFADEZAS DO MALASARTES
Pedro Bandeira
1. O PÁSSARO LAPÃO
Do tal Pedro Malasartes, você já ouviu falar?
Pois prepare sua risada que estou pronto pra contar.
Esse Pedro é uma caipira bem do tipo brasileiro:
É quietão, de fala mansa, mas sabido e muito arteiro.
Pra dar duro no batente, nosso Pedro é só preguiça,
mas não perde ocasião de vingar uma injustiça.
E injustiça é o que não falta pra qualquer pobre roceiro
Pois prepare sua risada que estou pronto pra contar.
Esse Pedro é uma caipira bem do tipo brasileiro:
É quietão, de fala mansa, mas sabido e muito arteiro.
Pra dar duro no batente, nosso Pedro é só preguiça,
mas não perde ocasião de vingar uma injustiça.
E injustiça é o que não falta pra qualquer pobre roceiro
Pois a lei só anda ao lado de quem tem muito dinheiro.
Foi assim que certa vez o Martinho Deodato,
capataz do coronel, foi caçar jacu no mato.
Quando ouviu um barulhinho, levou a espingarda ao peito,
mas errou a pontaria, deu um tiro tão sem jeito
que matou o cabritinho da viúva do Chicão
e em vez de pagar a perda ainda disse um palavrão!
A viúva foi ao Pedro contar a situação.
Pedro não era de briga, mas jurou reparação.
Tratou logo de comer uma janta reforçada:
rapadura, dois repolhos e uma enorme feijoada...
Foi assim que certa vez o Martinho Deodato,
capataz do coronel, foi caçar jacu no mato.
Quando ouviu um barulhinho, levou a espingarda ao peito,
mas errou a pontaria, deu um tiro tão sem jeito
que matou o cabritinho da viúva do Chicão
e em vez de pagar a perda ainda disse um palavrão!
A viúva foi ao Pedro contar a situação.
Pedro não era de briga, mas jurou reparação.
Tratou logo de comer uma janta reforçada:
rapadura, dois repolhos e uma enorme feijoada...
E, montado na mulinha, foi trotando, num instante,
passou pelo boticário e tomou um bom purgante!
Frente à casa do Martinho, agachou-se bem na estrada.
Esperou fazer efeito e soltou a feijoada!
Com o seu velho chapéu, tudo aquilo ele tapou
e agarrando bem as abas, calmamente ele esperou.
Foi aí que o Deodato a tal cena veio ver,
mas achando muito estranho, malcriado quis saber:
- Mas que cheiro será esse? Que fedor vem dessa estrada!
Frente à casa do Martinho, agachou-se bem na estrada.
Esperou fazer efeito e soltou a feijoada!
Com o seu velho chapéu, tudo aquilo ele tapou
e agarrando bem as abas, calmamente ele esperou.
Foi aí que o Deodato a tal cena veio ver,
mas achando muito estranho, malcriado quis saber:
- Mas que cheiro será esse? Que fedor vem dessa estrada!
- É catinga da mulinha, que anda meio enfastiada...
-Que será que está havendo? Será louco esse sujeito?
O que está fazendo aí, agachado desse jeito?
Pra erguer esse chapéu você não tem força, não?
Ou será que esse chapéu tá pregado aí no chão?
Malasartes até gostou da caçoada do safado,
pois chegara a ocasião de fisgá-lo bem fisgado:
-Nada disso, meu amigo, é que eu consegui pegar
o tal pássaro lapão que não pode me escapar.
O que está fazendo aí, agachado desse jeito?
Pra erguer esse chapéu você não tem força, não?
Ou será que esse chapéu tá pregado aí no chão?
Malasartes até gostou da caçoada do safado,
pois chegara a ocasião de fisgá-lo bem fisgado:
-Nada disso, meu amigo, é que eu consegui pegar
o tal pássaro lapão que não pode me escapar.
Quando voa, as suas penas enchem de cores o céu.
Mas agora ele está preso debaixo do meu chapéu.
Foi assim que aconteceu: fui chegando de mansinho,
dei um bote bem certeiro, e peguei o passarinho!
Ele é muito valioso: a mulher do delegado
prometeu dar um milhão se eu pegar este danado...
Quando ouviu falar daquilo, a cobiça começou
a crescer no Deodato, e o safado comentou:
-Um milhão é um bom dinheiro, muito mais que o senhor pensa.
E por que não vai buscar essa grande recompensa?
Ele é muito valioso: a mulher do delegado
prometeu dar um milhão se eu pegar este danado...
Quando ouviu falar daquilo, a cobiça começou
a crescer no Deodato, e o safado comentou:
-Um milhão é um bom dinheiro, muito mais que o senhor pensa.
E por que não vai buscar essa grande recompensa?
A arapuca estava pronta, só
faltava um bocadinho
para ver o Deodato cair nela direitinho.
Esse é um bicho delicado, qualquer coisa lhe faz mal.
Só se deve transportá-lo em gaiola especial.
A gaiola é muito cara, fabricada no estrangeiro,
e eu nem sei o que fazer já que não tenho dinheiro...
A cobiça foi crescendo, até dava comichão,
pois aquele capataz só pensava no milhão:
-Vou enganar esse caipira, pelo jeito ele é um cretino.
Não fosse eu, o Deodato, um sujeito tão ladino...
Se a questão era dinheiro, e se o outro nada tinha,
para ele estava fácil, era só manter a linha:
-Gostaria de ajudar a o problema resolver.
A gaiola, quanto custa? Gostaria eu de saber...
Malasartes suspirou, fez um cálculo mental,
lembrou da boa viúva e do seu pobre animal.
-A gaiola, meu amigo, é bem cara, eu admito.
Ela custa, lá na venda, mais que o preço de um cabrito...
Sem perder nem um segundo, nem contar o que continha,
Deodato lhe estendeu a carteira bem cheinha:
- Aqui está todo o dinheiro, não precisa nem contar.
Deixe que eu seguro as abas, e a gaiola vá comprar!
Malasartes foi pegando o dinheiro sem demora,
montou rápido na mula e tratou de ir logo embora.
Foi pra casa da viúva, que chegou a dar um grito
quando viu tanto dinheiro pra comprar outro cabrito.
para ver o Deodato cair nela direitinho.
Esse é um bicho delicado, qualquer coisa lhe faz mal.
Só se deve transportá-lo em gaiola especial.
A gaiola é muito cara, fabricada no estrangeiro,
e eu nem sei o que fazer já que não tenho dinheiro...
A cobiça foi crescendo, até dava comichão,
pois aquele capataz só pensava no milhão:
-Vou enganar esse caipira, pelo jeito ele é um cretino.
Não fosse eu, o Deodato, um sujeito tão ladino...
Se a questão era dinheiro, e se o outro nada tinha,
para ele estava fácil, era só manter a linha:
-Gostaria de ajudar a o problema resolver.
A gaiola, quanto custa? Gostaria eu de saber...
Malasartes suspirou, fez um cálculo mental,
lembrou da boa viúva e do seu pobre animal.
-A gaiola, meu amigo, é bem cara, eu admito.
Ela custa, lá na venda, mais que o preço de um cabrito...
Sem perder nem um segundo, nem contar o que continha,
Deodato lhe estendeu a carteira bem cheinha:
- Aqui está todo o dinheiro, não precisa nem contar.
Deixe que eu seguro as abas, e a gaiola vá comprar!
Malasartes foi pegando o dinheiro sem demora,
montou rápido na mula e tratou de ir logo embora.
Foi pra casa da viúva, que chegou a dar um grito
quando viu tanto dinheiro pra comprar outro cabrito.
Agarrado
bem nas abas, pôs-se o Martinho a pensar,
ainda achando muito estranho aquele cheiro no ar:
- Mas que cheiro será esse? Que fedor vem dessa estrada!
Vai ver foi mesmo a mulinha, que anda meio enfastiada!
O Martinho Deodato ficou vendo o Pedro ir
e assim que se viu sozinho, bem feliz ficou a rir:
-Pelo preço de um cabrito, vou ganhar esse milhão!
Agora é só agarrar o tal pássaro lapão!
Foi pegar o passarinho, mas, com medo de feri-lo,
devagar ergueu a aba e enfiou a mão... naquilo!
Ai, que o Pedro Malasartes é um sujeito bem danado!
E eu estou muito satisfeito se você achou gozado.
Só que eu quero uma ajuda pra fazer final diverso
para a história que eu contei e que foi narrada em verso.
O final de uma anedota muito jeito tem para ser.
Se você encontrar a rima, outro verso eu vou fazer:
Foi pegar o passarinho de uma forma meio lerda,
devagar ergueu a aba e enfiou a mão na... (ache a rima
certa!)
Achou? Muito bem, bem, bem!
Mas que sensibilidade! Você está de parabéns!
Uma alma de poeta de nascença você tem!
Uma rima é uma rima, dos poetas é a glória,
Pois podia ser assim o final da nossa história:
Foi pegar o passarinho, bem do jeito que ele gosta.
Devagar ergueu a aba e enfiou a mão na... (ache a rima certa!)
Achou? Muito bem, bem, bem!
Você é um poeta nato do começo até o final!
Isso eu posso garantir: é um artista sem igual!
De encontrar fico feliz tão profunda inspiração.
Ver poesia a transbordar da alma e do coração!
Fazer poesia é bem fácil, vou contar como se faz.
Todo verso dá bem certo para a frente e para trás.
Estes versos, eu repito, pra o que eu disse comprovar.
Vamos ver se fica certo se as palavras eu mudar:
Fico feliz de encontrar inspiração tão profunda.
Ver transbordar a poesia do coração e da... (ache a rima
certa!)
Achou? Muito bem, bem, bem!
Tá vendo como deu certo esse jeito de rimar?
Pra artista como você
é bem fácil ensinar!
Só que eu me despeço, pois eu tenho de partir.
Mas eu levo o seu carinho se quiser me aplaudir!
2. O CAVALO ALAZÃO
Tem também aquela história de um belíssimo alazão
Que fugiu da propriedade do compadre Jeromão.
O cavalo era demais, animal de raça pura,
Em qualquer exposição, sempre fez boa figura.
Da família do compadre, o cavalo era a riqueza
E o desaparecimento, o que trouxe foi tristeza.
O alazão apareceu no arraial do coronel,
Homem muito poderoso, ele aqui e Deus no céu.
E o danado decidiu que o cavalo ia ser seu:
- Se ele entrou na minha terra, então foi Deus que me deu!
Malasartes ia passando, quando viu o Jeromão
Infeliz de dar piedade e pedir consolação.
- Jeromão, que cara é essa de tristeza e desatino?
O seu jeito é de quem tá sofrendo do intestino...
- Meu compadre Malasartes, veja que infelicidade!
Meu cavalo não é mais meu, dele só ficou saudade...
Meu cavalo valioso, meu belíssimo alazão,
Agora é propriedade do maldito de um ladrão!
O compadre contou tudo, tudo ouviu o Malasartes,
E o amigo prometeu fazer logo a sua parte.
Arranjou um gato preto, velho, feio e esmolambado,
E enfiou cinco moedas no traseiro do coitado...
Então foi todo feliz, com o gato na mochila,
Procurar o coronel, que devia estar na vila.
Realmente lá estava e montado no alazão
Preparando os eleitores para a próxima eleição.
Lá de dentro do bolsinho, Malasartes retirou
Outras dez moedas novas que na mão ele deixou.
Devagar foi se chegando e contando o seu relato.
Numa mão tinha moedas e na outra tinha um gato.
- Imaginem, meus amigos, vejam só que sorte a minha:
Agora eu tenho sustento para minha vida inteirinha!
Eu não sei se por encanto, ou milagre verdadeiro,
Encontrei esse gatinho que é uma usina de dinheiro.
Esse gato é a sorte grande, quem tem ele não tem fome.
Apertando-lhe a barriga, bom dinheiro ele descome!
Coronel achou estranha toda aquela explicação.
Duvidou bem duvidado e tirou satisfação:
- Isso para mim é papo de sujeito trapaceiro.
Imagine se de um gato sai moeda do traseiro!
Um milagre desse jeito é preciso ver pra crer.
Quero ver como é que pode o dinheiro aparecer!
Exibindo as dez moedas, Malasartes abriu a mão
Para o homem ver de perto lá de cima do alazão.
- Não duvide, coronel, que o que eu conto seja um fato.
Veja só estas moedas que eu tirei aqui do gato.
E eu espero que o bichano tenha mais a oferecer.
Com um gato como este, bom dinheiro espero ter!
Coronel se interessou, mas fingiu que não ligava
E naquele disparate ele não acreditava:
- Um punhado de moedas qualquer um pode trazer.
O que eu quero é ver o gato mais dinheiro descomer.
Se eu não vir tirar do gato as moedas lá do fundo,
É melhor levar daqui esse gato vagabundo!
Na barriga do bichano, Pedro deu uma espremida
E do fiofó do gato a moeda foi cuspida.
Assombrou-se o coronel, e a surpresa foi geral:
- Esse gato é de espantar, maravilha sem igual!
Nunca mais vou ter problemas se esse gato eu possuir.
Quanto custa esse bichano? pago o que você pedir!
Mas o Pedro tinha um plano e ele tinha de dar certo,
Era só continuar pois já estava quase perto.
- De dinheiro eu não preciso, nunca mais vou trabalhar,
Pois o gato me oferece tudo o que eu quiser comprar.
De uma vida bem melhor acho que estou no começo.
Me desculpe, coronel, mas gato não tem preço.
É tal qual o seu cavalo, com o garbo que ele tem.
Eu bem sei que vale muito e não tem preço também.
Concluiu o coronel ter achado a solução,
E propôs trocar o gato pau a pau pelo alazão:
- Se uma coisa não tem preço e uma outra também não,
É trocar elas por elas, sem qualquer hesitação!
Malasartes resistiu, fez-se um pouco de rogado,
Afirmando que ao bichano ele estava bem ligado.
Insistiu o coronel que a proposta era perfeita.
Malasartes concordou, logo a troca estava feita.
Cavalgou sem mais demora o lindíssimo alazão
E foi devolver ao dono, o compadre Jeromão.
Foi pra casa o coronel, aos pulinhos de contente,
Pois sonhava que a fortuna já chegara, finalmente.
Espremeu o pobre gato, já que agora ele era seu.
Logo algumas moedinhas o bichano descomeu.
Mas qual foi sua surpresa, quando viu que do tal gato
Ouro não saía mais, só saía... desacato!
Apenas do cheiro, de trabalho tão imundo,
Insistiu em procurar, com o dedo lá no fundo.
Já cansado dos maus-tratos, de ser tanto aperreado,
O bichano deu um salto e fugiu desesperado.
Desde então, o coronel ficou louco, há quem diga,
Procurando um gato preto pra apertar sua barriga.
Vive cheio de arranhões e borrado por inteiro.
E se todos fogem dele é por causa do mau cheiro...
3. O SACO ADIVINHO
Foi que foi,e o Malasartes, numa certa ocasião,
enredou-se numa história que foi só complicação.
O casal Pinto da Silva, gente ruim de dar com pau,
não pagava o que devia ao compadre Nicolau.
Toda vez que o Nicolau ia lá para cobrar,
os dois falsos se queixavam, começavam a chorar:
- Tenha pena, Nicolau! Veja que situação.
Nós dois não temos dinheiro pra comprar nem mesmo um pão.
Na verdade somos pobres e essa terra nada dá,
mesmo que a gente trabalhe dia e noite sem parar.
O problema inda é maior quando o caso é a criação,
pois a cobra vem e mata o pato, o porco e o leitão.
Paciência, Nicolau! Você só tem que esperar,
pois um dia a nossa vida haverá de melhorar.
Pois quem sabe ano que vem, e se dessa vez chover,
pode ser que o que eu plante no verão venha a crescer.
Pra salvar a criação, e se a cobra eu for matar,
estou certo que as galinhas muitos ovos vão botar...
O compadre foi embora e saiu sem um vintém,
pois aqueles dois malandros não pagavam a ninguém.
Sem saber o que fazer, Nicolau subiu o morro,
procurou o Malasartes e pediu o seu socorro.
Pedro viu que era difícil enganar o tal casal,
mas na hora ele criou uma ideia original.
Com um laço bem armado lá na ponta de um bambu,
conseguiu capturar um idoso urubu.
O urubu era tão velho que nem soube espernear.
Pois foi só pegar a ave e num saco encafuar.
Em seguida o pedro foi, carregando o velho saco,
espiar pela janela o casal lá no barraco.
Viu a dona preparando um leitão esplendoroso
e também viu queijos, vinhos e um feijão muito cheiroso.
O dinheiro do casal, nota a nota a contar,
o marido conferia esperando pra jantar.
Pedro foi bater à porta lá daquela moradia,
mas voltou para a janela pra ver o que acontecia.
Viu os dois surpreendidos esconder toda a comida
dentro de um armário grande que fecharam em seguida.
O marido, surpreendido, o dinheiro pôs num prato
e enfiou numa gaveta que fechou logo no ato.
Quando enfim se abriu a porta, Malasartes, bem esperto,
pediu pouso e comida já que a noite estava perto.
- Se ao amigo não ofendem a pobreza deste lar
e uma cuia de farinha, não se acanhe, pode entrar!
Malasartes agradeceu gentilmente e entrou,
pondo o saco bem debaixo da cadeira onde sentou.
Um punhado de farinha estendeu-lhe a talmulher
e ela ainda ofereceu uma cuia e uma colher.
Malasartes, novamente, educado agradeceu
mas olhando para o saco deu-lhe um chute que doeu.
Lá de dentro, do urubu, veio um ronco da barriga.
Pedro fez uma cara bem séria e disse alto: - Não me diga!
A mulher achou gozado e curiosa quis saber:
- Não sei como o senhor pode para um saco responder...
- Isso é estranho, eu concordo - respondeu o Malasartes.
- É que o saco é adivinho, e eu o levo a toda parte.
- Me desculpe o visitante - marido riu com troça.
- Mas um saco adivinhar eu não vejo como possa...
Malasartes concordou: - É difícil de se crer,
mas é bom saber que o saco acabou de me dizer
que o casal que me hospeda e alivia a minha fome
é uma gente muito fina que tem belo sobrenome.
É o casal Pinto da Silva, gente boa onde estiver,
sendo o Silva do marido, e o Pinto da mulher.
- Está certo, isso eu não nego - confirmou rindo o marido.
- O meu nome todos sabem, eu sou muito conhecido.
Em resposta ao que foi dito, Malasartes nem piscou.
Novamente deu um chute e outro ronco se escutou.
- A razão está consigo - disse o Pedro. - Isso é possível.
Mas agora o saco mágico falou coisa mais incrível.
Disse que naquele armário tem bom vinho e tem feijão,
tem arroz, tem queijo fino, tem até u bom leitão!
O casal teve de abrir o armário sem demora,
trazer tudo para a mesa e servir na mesma hora.
Malasartes comeu bem, regalou-se, o bom velhaco.
E no fim da refeição apertou de novo o saco.
- Mas o que virá? - perguntou o anfitrião.
- Quando o saco faz barulho, lá vem adivinhação!
- Está certo, meu compadre - disse o Pedro Malasartes.
- Me perdoe se esse saco deu de novo forte aparte.
Esse saco disse agora, e foi isso que eu ouvi,
que tem prato com dinheiro na gaveta logo ali!
- Esse saco é um portento! - a mulher disse ao marido,
sem nem se preocupar se o bom Pedro tinha ouvido.
- Quero o saco para mim, essa grande descoberta!
Vá pegar nosso dinheiro, pra fazer logo uma oferta!
O marido foi depressa o dinheiro procurar.
Mal sabia quanto o Pedro era mestre em pechinchar.
Pedro fez que não queria, regateou desde o começo.
Mas o Silva fez questão e foi aumentando o preço.
Quando o preço foi chegando ao valor que era devido
ao compadre Nicolau, Pedro deu-se por vencido:
- Está bem, eu vou vender, mas estou penalizado.
Só espero que em sua casa ele seja bem tratado.
O dinheiro do casal, bem feliz Pedro embolsou.
Despediu-se aliviado e o urubu ele entregou.
Ao compadre Nicolau, Malasartes foi ligeiro
e feliz com o sucesso devolveu todo o dinheiro.
A mulher mais o marido, a princípio com cuidado,
deram chutes e apertões no tal saco enfeitiçado.
Mas do saco, em desespero, por sofrer tanto apertão,
só saíam roncos tristes e nenhuma predição.
Resolveram abrir o saco para ver se era encantado,
mas lá dentro só encontraram o urubu já desmaiado!
Em qualquer exposição, sempre fez boa figura.
Da família do compadre, o cavalo era a riqueza
E o desaparecimento, o que trouxe foi tristeza.
O alazão apareceu no arraial do coronel,
Homem muito poderoso, ele aqui e Deus no céu.
E o danado decidiu que o cavalo ia ser seu:
- Se ele entrou na minha terra, então foi Deus que me deu!
Malasartes ia passando, quando viu o Jeromão
Infeliz de dar piedade e pedir consolação.
- Jeromão, que cara é essa de tristeza e desatino?
O seu jeito é de quem tá sofrendo do intestino...
- Meu compadre Malasartes, veja que infelicidade!
Meu cavalo não é mais meu, dele só ficou saudade...
Meu cavalo valioso, meu belíssimo alazão,
Agora é propriedade do maldito de um ladrão!
O compadre contou tudo, tudo ouviu o Malasartes,
E o amigo prometeu fazer logo a sua parte.
Arranjou um gato preto, velho, feio e esmolambado,
E enfiou cinco moedas no traseiro do coitado...
Então foi todo feliz, com o gato na mochila,
Procurar o coronel, que devia estar na vila.
Realmente lá estava e montado no alazão
Preparando os eleitores para a próxima eleição.
Lá de dentro do bolsinho, Malasartes retirou
Outras dez moedas novas que na mão ele deixou.
Devagar foi se chegando e contando o seu relato.
Numa mão tinha moedas e na outra tinha um gato.
- Imaginem, meus amigos, vejam só que sorte a minha:
Agora eu tenho sustento para minha vida inteirinha!
Eu não sei se por encanto, ou milagre verdadeiro,
Encontrei esse gatinho que é uma usina de dinheiro.
Esse gato é a sorte grande, quem tem ele não tem fome.
Apertando-lhe a barriga, bom dinheiro ele descome!
Coronel achou estranha toda aquela explicação.
Duvidou bem duvidado e tirou satisfação:
- Isso para mim é papo de sujeito trapaceiro.
Imagine se de um gato sai moeda do traseiro!
Um milagre desse jeito é preciso ver pra crer.
Quero ver como é que pode o dinheiro aparecer!
Exibindo as dez moedas, Malasartes abriu a mão
Para o homem ver de perto lá de cima do alazão.
- Não duvide, coronel, que o que eu conto seja um fato.
Veja só estas moedas que eu tirei aqui do gato.
E eu espero que o bichano tenha mais a oferecer.
Com um gato como este, bom dinheiro espero ter!
Coronel se interessou, mas fingiu que não ligava
E naquele disparate ele não acreditava:
- Um punhado de moedas qualquer um pode trazer.
O que eu quero é ver o gato mais dinheiro descomer.
Se eu não vir tirar do gato as moedas lá do fundo,
É melhor levar daqui esse gato vagabundo!
Na barriga do bichano, Pedro deu uma espremida
E do fiofó do gato a moeda foi cuspida.
Assombrou-se o coronel, e a surpresa foi geral:
- Esse gato é de espantar, maravilha sem igual!
Nunca mais vou ter problemas se esse gato eu possuir.
Quanto custa esse bichano? pago o que você pedir!
Mas o Pedro tinha um plano e ele tinha de dar certo,
Era só continuar pois já estava quase perto.
- De dinheiro eu não preciso, nunca mais vou trabalhar,
Pois o gato me oferece tudo o que eu quiser comprar.
De uma vida bem melhor acho que estou no começo.
Me desculpe, coronel, mas gato não tem preço.
É tal qual o seu cavalo, com o garbo que ele tem.
Eu bem sei que vale muito e não tem preço também.
Concluiu o coronel ter achado a solução,
E propôs trocar o gato pau a pau pelo alazão:
- Se uma coisa não tem preço e uma outra também não,
É trocar elas por elas, sem qualquer hesitação!
Malasartes resistiu, fez-se um pouco de rogado,
Afirmando que ao bichano ele estava bem ligado.
Insistiu o coronel que a proposta era perfeita.
Malasartes concordou, logo a troca estava feita.
Cavalgou sem mais demora o lindíssimo alazão
E foi devolver ao dono, o compadre Jeromão.
Foi pra casa o coronel, aos pulinhos de contente,
Pois sonhava que a fortuna já chegara, finalmente.
Espremeu o pobre gato, já que agora ele era seu.
Logo algumas moedinhas o bichano descomeu.
Mas qual foi sua surpresa, quando viu que do tal gato
Ouro não saía mais, só saía... desacato!
Apenas do cheiro, de trabalho tão imundo,
Insistiu em procurar, com o dedo lá no fundo.
Já cansado dos maus-tratos, de ser tanto aperreado,
O bichano deu um salto e fugiu desesperado.
Desde então, o coronel ficou louco, há quem diga,
Procurando um gato preto pra apertar sua barriga.
Vive cheio de arranhões e borrado por inteiro.
E se todos fogem dele é por causa do mau cheiro...
3. O SACO ADIVINHO
Foi que foi,e o Malasartes, numa certa ocasião,
enredou-se numa história que foi só complicação.
O casal Pinto da Silva, gente ruim de dar com pau,
não pagava o que devia ao compadre Nicolau.
Toda vez que o Nicolau ia lá para cobrar,
os dois falsos se queixavam, começavam a chorar:
- Tenha pena, Nicolau! Veja que situação.
Nós dois não temos dinheiro pra comprar nem mesmo um pão.
Na verdade somos pobres e essa terra nada dá,
mesmo que a gente trabalhe dia e noite sem parar.
O problema inda é maior quando o caso é a criação,
pois a cobra vem e mata o pato, o porco e o leitão.
Paciência, Nicolau! Você só tem que esperar,
pois um dia a nossa vida haverá de melhorar.
Pois quem sabe ano que vem, e se dessa vez chover,
pode ser que o que eu plante no verão venha a crescer.
Pra salvar a criação, e se a cobra eu for matar,
estou certo que as galinhas muitos ovos vão botar...
O compadre foi embora e saiu sem um vintém,
pois aqueles dois malandros não pagavam a ninguém.
Sem saber o que fazer, Nicolau subiu o morro,
procurou o Malasartes e pediu o seu socorro.
Pedro viu que era difícil enganar o tal casal,
mas na hora ele criou uma ideia original.
Com um laço bem armado lá na ponta de um bambu,
conseguiu capturar um idoso urubu.
O urubu era tão velho que nem soube espernear.
Pois foi só pegar a ave e num saco encafuar.
Em seguida o pedro foi, carregando o velho saco,
espiar pela janela o casal lá no barraco.
Viu a dona preparando um leitão esplendoroso
e também viu queijos, vinhos e um feijão muito cheiroso.
O dinheiro do casal, nota a nota a contar,
o marido conferia esperando pra jantar.
Pedro foi bater à porta lá daquela moradia,
mas voltou para a janela pra ver o que acontecia.
Viu os dois surpreendidos esconder toda a comida
dentro de um armário grande que fecharam em seguida.
O marido, surpreendido, o dinheiro pôs num prato
e enfiou numa gaveta que fechou logo no ato.
Quando enfim se abriu a porta, Malasartes, bem esperto,
pediu pouso e comida já que a noite estava perto.
- Se ao amigo não ofendem a pobreza deste lar
e uma cuia de farinha, não se acanhe, pode entrar!
Malasartes agradeceu gentilmente e entrou,
pondo o saco bem debaixo da cadeira onde sentou.
Um punhado de farinha estendeu-lhe a talmulher
e ela ainda ofereceu uma cuia e uma colher.
Malasartes, novamente, educado agradeceu
mas olhando para o saco deu-lhe um chute que doeu.
Lá de dentro, do urubu, veio um ronco da barriga.
Pedro fez uma cara bem séria e disse alto: - Não me diga!
A mulher achou gozado e curiosa quis saber:
- Não sei como o senhor pode para um saco responder...
- Isso é estranho, eu concordo - respondeu o Malasartes.
- É que o saco é adivinho, e eu o levo a toda parte.
- Me desculpe o visitante - marido riu com troça.
- Mas um saco adivinhar eu não vejo como possa...
Malasartes concordou: - É difícil de se crer,
mas é bom saber que o saco acabou de me dizer
que o casal que me hospeda e alivia a minha fome
é uma gente muito fina que tem belo sobrenome.
É o casal Pinto da Silva, gente boa onde estiver,
sendo o Silva do marido, e o Pinto da mulher.
- Está certo, isso eu não nego - confirmou rindo o marido.
- O meu nome todos sabem, eu sou muito conhecido.
Em resposta ao que foi dito, Malasartes nem piscou.
Novamente deu um chute e outro ronco se escutou.
- A razão está consigo - disse o Pedro. - Isso é possível.
Mas agora o saco mágico falou coisa mais incrível.
Disse que naquele armário tem bom vinho e tem feijão,
tem arroz, tem queijo fino, tem até u bom leitão!
O casal teve de abrir o armário sem demora,
trazer tudo para a mesa e servir na mesma hora.
Malasartes comeu bem, regalou-se, o bom velhaco.
E no fim da refeição apertou de novo o saco.
- Mas o que virá? - perguntou o anfitrião.
- Quando o saco faz barulho, lá vem adivinhação!
- Está certo, meu compadre - disse o Pedro Malasartes.
- Me perdoe se esse saco deu de novo forte aparte.
Esse saco disse agora, e foi isso que eu ouvi,
que tem prato com dinheiro na gaveta logo ali!
- Esse saco é um portento! - a mulher disse ao marido,
sem nem se preocupar se o bom Pedro tinha ouvido.
- Quero o saco para mim, essa grande descoberta!
Vá pegar nosso dinheiro, pra fazer logo uma oferta!
O marido foi depressa o dinheiro procurar.
Mal sabia quanto o Pedro era mestre em pechinchar.
Pedro fez que não queria, regateou desde o começo.
Mas o Silva fez questão e foi aumentando o preço.
Quando o preço foi chegando ao valor que era devido
ao compadre Nicolau, Pedro deu-se por vencido:
- Está bem, eu vou vender, mas estou penalizado.
Só espero que em sua casa ele seja bem tratado.
O dinheiro do casal, bem feliz Pedro embolsou.
Despediu-se aliviado e o urubu ele entregou.
Ao compadre Nicolau, Malasartes foi ligeiro
e feliz com o sucesso devolveu todo o dinheiro.
A mulher mais o marido, a princípio com cuidado,
deram chutes e apertões no tal saco enfeitiçado.
Mas do saco, em desespero, por sofrer tanto apertão,
só saíam roncos tristes e nenhuma predição.
Resolveram abrir o saco para ver se era encantado,
mas lá dentro só encontraram o urubu já desmaiado!